Cadastro nada positivo, por Guilherme Gaya.


Paula Brito - 16/04/2018

Os consumidores brasileiros estão prestes a ter a privacidade de todos os seus dados cadastrais entregue de bandeija para qualquer pessoa ou empresa que queira ter acesso. E o pior, tudo de forma legal.

O Projeto de Lei Complementar (PLP) 441/17, da Câmara dos Deputados, que estabelece o chamado Cadastro Positivo de Contribuintes, altera as regras e possibilita que os dados sobre qualquer compra ou compromisso financeiro sejam obrigatoriamente repassados aos serviços de crédito (Serasa, SCPC, etc), independentemente da vontade do cidadão. Exatamente da mesma maneira como já é feito com os negativados, e sem configurar quebra do sigilo bancário.

Acompanhada pela promessa de queda dos juros bancários e de facilitação de crédito, a matéria vem sendo tratada como algo favorável.

Mas o que devemos lembrar nesse momento é que o mercado financeiro há muito tempo já adota essa prática e o consumidor até agora não sentiu nenhum alívio nos valores das taxas. Pelo contrário, a consequência será impor ainda mais cobranças para o contribuinte, com sistemas de consultas. O que vai penalizar sobretudo os economicamente menos favorecidos, que dependem mais de acesso a crédito.

No Brasil, há centenas de anos contamos com diversos instrumentos jurídicos que já suprem as reais necessidades do mercado em saber quem não honra as suas dívidas e claramente é considerado inadimplente. Logo, não há a necessidade de um “Cadastro Positivo”, uma vez que se a pessoa não está negativa, ela automaticamente já está no outro grupo. E isso sem que terceiros acessem dados que atualmente são sigilosos!

A criação de um “Cadastro Positivo” claramente fere o direito à privacidade de cada indivíduo e não ajuda em nada o trabalho que já é realizado com os consumidores negativados. A elaboração do projeto até pode ser considerada uma importante iniciativa, mas o seu texto está recheado de imperfeições. Afinal, o que esse pretendido novo sistema poderá fazer é legitimar uma prática comercial irregular cuja consolidação é sabidamente conhecida, em vez de ser combatida à luz do atual Código de Defesa do Consumidor.

* Guilherme Gaya é presidente do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil (IEPTB-/SC)

Fonte: Estadão


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